Entrevista com Marquinho, sommelier de Brasília
Vinhos

Entrevista com Marquinho, sommelier de Brasília




Bater um papo sobre vinho com o Marquinho é aula e diversão na certa.

Nesta entrevista ele dá algumas dicas preciosas para amantes e iniciantes.




ViVinhos: Quando e como você começou no mundo dos vinhos?
Marquinho: Em Curitiba, com 16 a 17 anos, trabalhava em um restaurante, quando foi um profissional dar um curso de vinhos e eu me interessei. Ele falava tanta coisa sobre os aromas e os paladares do vinho, mas eu provava o vinho: gosto de vinho, cheiro de vinho, não tinha pimentão nem nada. Aí, eu achei que era besteira. O mesmo profissional voltou depois de 6 meses, para dar a mesma aula e novamente falou que o vinho tinha aromas de pimentão, ervas secas, e eu não sentia nada, só o gosto de vinho e o cheiro de vinho. Achei que era um problema comigo e comprei o meu primeiro livro: "Brancos e Tintos", do Saulo Galvão. Comecei a estudar e vi que o vinho vai além de uma bebida normal. Aí eu comecei a tomar vinho, a apreciar, prestar atenção na hora de bebê-lo de verdade, e aos poucos fui descobrindo as características que ele tinha.

ViVinhos: Quando você começou gostava dos vinhos mais suaves e frutados?
Marquinho: Sem dúvidas, porque eu acho que essa é a porta de acesso, apesar de hoje em dia muita gente falar "esse vinho não presta", acho que 99% das pessoas começaram com o famoso Liebfraumilch (risos), em 89 no Brasil, quando abriu para importação, ou antes dele eram os vinhos suaves, os vinhos de colônia, de garrafão. Eram vinhos bons para nós na época, porque nosso paladar era esse. Então, eu comecei como todo mundo e acho que foi legal, porque hoje eu sei o que estes vinhos são. Quem começa a tomar vinho hoje tem que iniciar com vinho suave. Se iniciar com vinho seco pode criar uma aversão e nunca mais tomar um vinho na vida dele.

ViVinhos: Conte alguma história curiosa que você já viveu com os vinhos.
Marquinho: Eu trabalhava no Dom Francisco, na época do Metropolitan, e uma senhora pediu um Tignanello. Ela pegou o vinho, pôs na boca e falou: "devolve que o vinho está estragado". Aí o gerente, Seu Abel, me falou: "Marcos vai lá na mesa 9 (isso eu nunca esqueço) porque a mulher devolveu um vinho de 300 e poucos reais”. Isso em 94, 95, então era um vinho caro. Aí, fui à mesa e perguntei para ela se eu poderia provar o vinho. Provei e falei: “o vinho está perfeito, está excelente" e ela falou pra mim que tinha tomado este mesmo vinho a 3 meses na Itália e estava bem melhor. Mas a safra que ela tinha tomado era de 7 anos antes, então o vinho já tinha evolução. Eu falei "senhora o vinho está bom", ela falou "Não! Devolve". Nisso, entrou o Seu Francisco, que é uma pessoa que conhece muito de vinho e é respeitado, provou o vinho e falou: "Nossa, que vinho maravilhoso!". Aí, ela tomou 2 garrafas do vinho (risos). Eu fiquei indignado, tinha 20 anos na época.

ViVinhos: Quais são seus vinhos preferidos, brancos e tintos?
Marquinho: Brancos: Estou gostando muito de alguns brancos feitos com a uva encruzado, de Portugal, com toque mineral e sem aquela fruta exagerada, com uma boa acidez, muito equilibrada. Os bons Vinhos Verdes feitos com a uva Alvarinho, eu adoro! Acho um vinho muito refrescante para um dia de calor. Alguns Chardonnay amadeirados, mas que tem estrutura e com a madeira bem casada, chilenos mesmo, como o Cordilheira Chardonnay, que nós temos aqui na loja. E um que eu tomei e adorei é o Sol del Sol, da Zahil, o melhor vinho da América do Sul Branco. É caro, uns R$ 180. E também tomar um bom Riesling Alemão, só que tem que desembolsar uma boa grana. Tem o aroma de petróleo, você vai viajar e deixar a imaginação por conta. É tomar e apreciar, é um vinho para ser apreciado. (ViVinhos: Chablis você gosta?) Chablis, não é um vinho que me agrada muito: eu sempre espero mais dele, um pouco mais de aroma, e um pouco mais de paladar as vezes. Talvez eu nunca tenha tomado um na idade certa, espero um dia tomar.
Dos tintos, eu gosto hoje dos bons alentejanos, que tem um custo benefício fantástico! O Douro começa a despontar bem. Espanhóis tanto da Rioja quanto da Ribera del Duero, na faixa de 30 a 60 reais, tem um leque muito bom de vinhos. O Coronas Tempranillo é delicado para o dia a dia. O Terra Plana é um ótimo vinho, também para o dia a dia. Quinta do Encontro, da Bairrada, Merlot com Baga, é um vinho fantástico. O Cabriz Reserva. Argentina e Chile são os vinhos que eu mais vendo, mas não são os vinhos que mais me agradam, eu fujo um pouquinho do excesso de peso.

ViVinhos: Qual característica no vinho que você não gosta?
Marquinho: Pesado e frutado demais. O vinho tem que ter o equilíbrio e um aroma complexo, não só aquela fruta muito madura, exagerada, que o deixa enjoativo ao passar do tempo e o paladar cansado. E também, vinho branco sem acidez. Vinho branco que não tem acidez refrescante não dá, como alguns Chardonnays acarvalhados, que eles exageram na fermentação malolática e esquecem a acidez.

Vivinhos: Qual é a harmonização entre pratos e vinhos de sua preferência?
Marquinho: É Foie Gras com Sauternes, ou um Tokaj. Para mim é bebida dos deuses! Se existe algo divino na comida e no vinho é essa combinação!
Também gosto de cordeiro com Cabernet Sauvignon, mas um pouco mais envelhecido, com mais idade, mais elegante. Esse é um problema muito sério hoje em harmonização: as pessoas colocam cordeiro com Cabernet Sauvignon jovem, muito pesado, e aí, acaba o cordeiro. Com chileno, tem que ser um bom vinho de 8 ou 10 anos de idade. Ou um bom vinho do Médoc ou um Saint Julien, de qualidade, é fantástico, eu gosto de cordeiro e sempre que a gente faz é unanimidade.

ViVinhos: Quais foram os melhores vinhos que você tomou?
Marquinho: Vega Sicília 81, Ribera del Duero, espanhol, foi um dos vinhos ícones que eu tomei. O Pomorosso, um Barbera D'Asti, em torno de uns 300 reais, para mim, mesmo nível de grandes Bordeaux, um vinho maravilhoso do Piemonte. Outro fantástico que eu tomei é o Solaia, mais elegante, mais delicado e muito mais complexo que o Sassicaia. Um vinho da Antinori maravilhoso. E é claro um bom Vinho do Porto de 20 anos de idade.

ViVinhos: Algum borgonha memorável?
Marquinho: Borgonha não tomei nenhum memorável até hoje. O melhor foi o Pommard 1er Cru que tomei a poucos dias e foi fantástico, mas ainda ficou aquém destes que mencionei. Tomei alguns Porto Vintage com 20, 30 anos de idade, que estão entre os melhores do mundo também. Tomei um 1880, o ano de fundação da casa Adriano Ramos Pinto, maravilhoso!! Ele não era mais líquido, era um xarope, fantástico! Foi na viagem a Portugal. Estávamos na vinícola, e perguntei ao Nicolau de Almeida, o enólogo da Adriano Ramos Pinto: "o vinho que vocês tomaram de 1880, realmente estava bom?". Ele pediu para esperar um pouco, foi lá dentro e pegou o garrafão de 30 litros, colocou em cima da mesa, tirou um tampão, e falou: "prova e me diga". (ViVinhos: Um garrafão de 30 litros?! Não... eu queria ter caído em um desses quando era pequeno...). Nós fizemos a roda e tomamos de joelhos, literalmente!!!

ViVinhos: Quais são os vinhos mais vendidos na Art du Vin?
Marquinho: Disparado: Terra Plana. Quinta do Encontro, Norton Malbec.
Tem o Pedriel, que é um vinho mais caro, e o Tignanello, que é um vinho de 300 reais a garrafa, e quando chega, acaba.

ViVinhos: A partir de quantos reais você acha que entra espiral decrescente entre custo e benefício, expectativa e prazer?
Marquinho: a partir de 500 reais, você cria uma expectativa muito grande e o vinho não corresponde. Com 500 reais pode se tomar um vinho maravilhoso, mas com 300 reais se pode tomar vinho superior a diversos vendidos por 1000, 1200, porque não tem o nome que eles tem. Porque o vinho não é só o produto, é a tradição, a história, a marca que ele tem. É uma grife como uma Ferrari. De 300 a 400 reais tem o Tignanello e o Alion são os vinhos que eu tomaria nesta faixa sem medo de errar.

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