Merdas sobre o pão — meia dúzia de generalidades acerca da fermentação de massas de panificação
Vinhos

Merdas sobre o pão — meia dúzia de generalidades acerca da fermentação de massas de panificação


Os pães feitos recorrendo a pré-fermentações tendem a ser invariavelmente melhores que os feitos pelo método dito directo — é um facto.

Ora, chama-se pré-fermento (pâte fermentée) a um agente levedante que se junta em vez do fermento propriamente dito à massa do pão.

Este não é mais que uma cultura fermentada, parcial ou totalmente baseada em fermentadores encontrados na atmosfera. Destes, talvez os mais importantes sejam os fungos do género Saccharomyces e algumas bactérias — das quais há que destacar os lactobacilos.

Na prática, um pré-fermento consiste numa mistura de farinha, água e fermento, mistura essa que se prepara com antecedência para depois se incorporar na massa do pão. São quatro os tipos de pré-fermento mais utilizados no fabrico de pão caseiro: biga, pouliche (poolish em inglês), esponja e massa azeda (sourdough).




Biga:


Embora a percentagem de hidratação — a propósito, sugiro o texto do seguinte link — deste pré-fermento de origem italiana possa oscilar entre os 45 e os 70%, o mais comum é que ande à volta dos 60%.

Uma vez uniformemente misturados os ingredientes do biga, este coloca-se num recipente e tapa-se de forma a perder o mínimo de água possível — tanto a tampa do recipiente como um saco de plástico servem perfeitamente para o efeito —, deixando-se fermentar durante um intervalo de tempo que poderá variar entre apenas umas horas e vários dias, sendo que quando o tempo de fermentação for superior a 24h, esta deverá sempre ocorrer em ambiente refrigerado.

A título de exemplo, para fazer um pão de trigo dos mais comuns — receita original, sem pré-fermentação: 500g de farinha de trigo para 300ml de água, 10g de fermento de padeiro e 2 colheres (de chá) de sal — um procedimento possível será o seguinte: preparar primeiro o biga, neste caso com apenas metade da quantidade total de farinha da receita, ou seja, misturar, durante 6 a 8min, 250g de farinha com 150ml de água (hidratação de 60%) e 5 a 7g de fermento de padeiro... e deixar a massa resultante repousar, tapada e à temperatura ambiente, durante 12 a 18h. Passado esse tempo, juntar ao pré-fermento o resto da farinha e da água, não esquecendo o sal, trabalhar a massa, moldá-la, enfarinhá-la também, e deixá-la fermentar uma segunda vez, durante 45min. O tempo desta segunda fermentação variará com a consistência da massa: entre 30min para as mais aguadas e 2h para as mais espessas. E este princípio é válido para todas as massas, independentemente do tipo de pré-fermentação que tenham sofrido. Por fim, levar ao forno, pré-aquecido a 220ºC, num tabuleiro enfarinhado, até a côdea dourar.

Claro que o exemplo dado acima não passa disso mesmo, já que quase tudo pode variar... desde a percentagem de farinha (em relação à quantidade total prevista pela receita) que se vai juntar ao biga — é possível fazê-lo com a totalidade da farinha, inclusive — até ao grau de hidratação do pré-fermento, passando pela quantidade de fermento que lhe é inicialmente adicionado, e que se poderá fazer variar conforme o tempo e a temperatura de fermentação... etc.. O número de variáveis é impressionante e, no fundo, não há nada como ir experimentando. Obter os resultados que mais agradam a cada um pode exigir uma boa dose de paciência.




Pouliche:


Elabora-se da mesma forma que o biga, mas tem sempre 100% de hidratação. Isto é, consiste numa mistura em partes iguais de água e farinha, mais uma parte — 10 a 50% — do fermento pedido pela receita. Este pré-fermento pode ser utilizado logo ao fim de 2 ou 3 horas, não devendo o tempo de fermentação exceder 12 horas, visto que esta cultura, mais aquosa, atinge o seu ponto de exaustão mais rapidamente.

Um exemplo prático: para fazer o mesmo pão de trigo «clássico» que já serviu para ilustrar a utilização do biga, um procedimento possível será o seguinte: preparar primeiro o pouliche, neste caso com apenas metade da quantidade total de farinha da receita, ou seja, misturar 250g de farinha com 250ml de água (hidratação de 100%) e 5 a 7g de fermento de padeiro durante 5min, deixando-o depois repousar, tapado e à temperatura ambiente, durante 3 a 12h. Passado esse tempo, juntar ao pré-fermento o resto da farinha, da água e o sal; trabalhar a massa resultante, moldá-la e deixá-la fermentar uma segunda vez durante 45min, antes de a levar ao forno, pré-aquecido a 220ºC, num tabuleiro enfarinhado, até a côdea dourar.




Esponja:


Porventura o método mais popular, este pode consistir quase numa infinidade coisas. Porém, por uma questão de diferenciação, digamos que se trata de uma mistura da totalidade da água com apenas metade da farinha pedida pela receita. Deixa-se fermentar duas a cinco horas; juntam-se depois os restantes ingredientes (metade da farinha e o sal) e faz-se o pão como habitualmente.

Exemplo: para o mesmo pão de trigo, um procedimento possível será o seguinte: preparar primeiro a esponja, neste caso com apenas metade da quantidade total de farinha da receita, digo, misturar (durante 3 a 5min) 250g de farinha com 300ml de água (a totalidade da água da receita) e 5 a 7g de fermento de padeiro; e deixar a mistura repousar, tapada e à temperatura ambiente, durante 2 a 5h. Depois, juntar ao pré-fermento o resto da farinha e o sal, trabalhar a massa resultante, moldá-la, deixá-la fermentar uma segunda vez durante 45 minutos e levá-la ao forno, pré-aquecido a 220ºC, num tabuleiro enfarinhado, até a côdea dourar.




Massa azeda:


(Em inglês, sourdough) Este tipo de pré-fermento é o mais antigo — aliás, o único possível antes de Pasteur e Hansen e do cultivo de leveduras seleccionadas. Os pães preparados com este pré-fermento costumam ficar mais escuros e possuir um travo característico, o que talvez tenha contribuído para que, com o tempo, tenha em boa parte sido substituído pelos demais métodos.

A massa em si é muito simples: consiste numa mistura de água e farinha que se deixa repousar por um período de tempo mais ou menos longo, base que vai servir de cultura apenas a leveduras «selvagens». Boas receitas da dita podem encontrar-se, por exemplo, aqui, aqui e aqui.

Quanto a exemplos de aplicações para massas levedadas segundo este método... podem encontrar muitos no blogue para onde vos remeto na hiperligação anterior.



Ainda uma nota muito importante: quando se preparam massas de fermentação igual ou superior a um dia, deve utilizar-se sempre água fria.



Para terminar, em jeito de adenda, parece-me oportuno referir um processo simples de multiplicação do chamado fermento de padeiro. Para simplificar, vai por passos:


1. Num recipiente grande, misturar 140g de farinha, 500ml de água — engarrafada — a uma temperatura de 40ºC e 25g de fermento fresco (ou 1 pacote de fermento de padeiro liofilizado).

2. Deixar fermentar bem tapado — de modo a perder o mínimo possível de humidade — e à temperatura ambiente, durante pelo menos 48h.

3. Volvido este tempo, o fermento está pronto para ser guardado no frigorífico ou utilizado. Ao que se quiser guardar no frio, é importante que se junte uma mistura de 250ml de leite, 120g de farinha (~250ml) e 50/55g (~65ml) de açúcar, uma vez por semana. Então, o ideal será deixar-se a totalidade da mistura levedar durante umas horas à temperatura ambiente antes de se colocar de novo no frigorífico.



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