Recebidos pelo Paulo Saturnino Cunha, que a falar dos seus vinhos transmite uma contagiante energia em que fica sempre aquela vontade de querer ouvir mais e mais sobre o que ele tem para nos contar. Produtor persistente na busca da melhor qualidade possível, luta com afinco por manter a tradição e não cair em demasia na tentação das modernices (vinhos extraídos ao limite barrados em madeira nova), pois ali naquele cantinho ribatejano nascem vinhos com raça, cheios de saber e de querer... direi vinhos com um carácter muito próprio, o mesmo que podemos encontrar na pessoa que dá a cara por este projecto familiar. Durante toda a prova deu para entender que ali se tenta fugir a um perfil cada vez mais massificado, são vinhos com uma maneira de estar muito própria, que apresentam uma invulgar acidez e taninos a prometerem boa evolução em garrafa, o filme é bom mas só começa quando todos estiverem sentados. A prova foi descontraída e com muita interacção entre convidados e responsáveis, com a gama de entrada Vinha do Alqueve a mostrar-nos vinhos frescos, jovens, descontraídos e com uma boa relação preço qualidade, todos eles a apresentarem já sinais muito próprios do perfil que marca todos os vinhos desta casa. Um Vinha do Alqueve Rosé 2009 que se mostrou seco, com fruto vermelho e leve rebuçado, perfil fresco e muito bem embrulhado em fina camada vegetal, Vinha do Alqueve branco 2009 bem fresco e citrino, acidez a dar boa dose de frescura num vinho de corpo mediano muito bem embalado para a mesa, Vinha do Alqueve tinto 2008 apelativo, frutado, simples, agradável e bem feito com leve vegetal em fundo na boca a mostrar-se pronto para consumo a acompanhar pratos de gastronomia tradicional.
Antes do Tradicional provaram-se os dois Quinta do Alqueve brancos, o Fernão Pires 2009 que tem sido elogiado mas que continuo a encostar ao lado para escolher o Chardonnay 2009, o primeiro muito mais cítrico, frutado, com acidez muito presente em perfil fresco, delicado e leve apimentado no final, já o segundo mostrou-se mais harmonioso, algo mais acolhedor derivado da leve passagem que teve por madeira, calda de ananás, suave e fresco. Na secção de tintos começámos com o Quinta do Alqueve Tradicional 2007, mais arredondado e cheio que o anterior tinto provado, nota-se novamente a fruta madura e limpa com vegetal seco em conjunto equilibrado e fresco. Salto na qualidade com o 2Worlds Reserva 2004, um vinho que junta a Touriga Nacional com a Cabernet Sauvignon, aqui com clara piscadela de olho ao mercado internacional, um vinho que é difícil não se gostar, sente-se uma ligeira extracção no peso que a fruta madura apresenta, especiaria e novamente a frescura, vegetal aqui mais contido e uma maior complexidade de conjunto, com frescura mediana na boca, macio, arredondado e fácil de se gostar e de levar à mesa. Provado ainda o novo 2Worlds 2007, deixou de ter a menção Reserva, mostrou-se um vinho em tudo na linha do 2004, porém tudo aqui a mostrar-se um pouco mais emaranhado e a precisar de tempo para se conseguir mostrar ao completo, vai portanto no bom caminho com uma prestação de muito bom nível.
Na gama Quinta de São João, a outra Quinta que faz parte deste projecto, provou-se o 2004 o 2007 e amostra do 2008. O 2004 mostrou-se o mais afinado, claramente o que mais gostava de rodar no copo, na seu fino bouquet de couro, pimenta, fruta em compota com canela, flores, frescura de boca com elegância e harmonia com nariz. Um vinho pronto a beber, coisa que o 2007 mostra bem menos, mais austero e fechado, algo duro com taninos a darem lugar a secura na prova de boca, boa envergadura, frescura e fruta, mas ainda a precisar de tempo, já o 2008 é muito promissor, talvez o melhor de todos os vinhos provados até aqui, uma dose muito boa de fruta com madeira a querer casar em estilo num conjunto que se nota fechado mas com pernas para andar.
Para último estavam guardadas as surpresas e que surpresas, primeiro os Quinta do Alqueve Syrah das colheitas 2007, 2008 e finalmente 2009 com duas versões, a barrica 9 e a barrica 12. O Syrah 2007 fez as minhas delícias, pleno de frescura com groselhas, pimentas, algum doce, complexidade, perfumado numa estrutura redondeada mas com vigor, harmonia e fruta preta madura. O 2008 seria mais fechado, menos pronto mas no mesmo caminho da glória... o que dizer mais de vinhos que se gostam. Já a prova das duas versões b9 e b12 foram o delírio, aqui o toque Australiano dado pelo enólogo consultor vem ao de cima, vinhos com aquele ar guloso, mokaccino, apimentado, mas ao mesmo tempo sério, com músculo, mas frescos e jovens sem saturar, um prazer ao serem bebidos e uma loucura quando se começou a imaginar e experimentar possíveis lotes com várias percentagens de um e de outro ali mesmo no copo. A acompanhar com muita atenção os novos Syrah da Quinta do Alqueve.
Foram colocados em prova também o Merlot e o Alicante Bouschet, gostei mais da prova que deu o Merlot, fresco, delicado, cetim com alguma secura vegetal (chá preto) e fruta bem viva com alguma doçura, que acompanhou lindamente uma Sopa da Pedra de Alpiarça graças a uma acidez muito presente que suportou a pujança do prato, o que irá ser deste Merlot ? Enquanto pensava nisto, lembrava-me das duas cuvées especiais que tinham sido provadas um pouco antes, ainda sem nome oficial foram tratadas por Cuvée Speciale e o Cuvée Royal. E se o primeiro já me tinha enchido as medidas pela elegância, amplitude contida com muita frescura, finesse e ao mesmo tempo limpidez de fruta, integração de barrica... o Royal foi a surpresa ainda maior, primeiro porque o vinho é um extreme de uma casta que nunca deu grandes vinhos estreme em Portugal, lembro de um ou outro que gostei muito mas até aos dias de hoje andava a 0, até ter provado este Royal que consegue ser sem grande problema o melhor exemplar a solo da Tinta Roriz em Portugal, direi um luxo de vinho. Acabei o almoço com o Quinta do Alqueve Colheita Tardia 2005, carregado na cor, aromas algo afagados pela plaina do tempo... sem grandes doses de açúcar mostra-se delicado e com suave frescura... muito agradável com um divinal Arroz Doce.
Em jeito de conclusão, os vinhos da Pinhal da Torre merecem e devem ser conhecidos por todos os amigos do vinho, não olham para uma região mas sim para uma vontade muito própria de um produtor, pelo convite que me foi feito deixo aqui os meus agradecimentos ao Paulo Saturnino Cunha e a toda a sua equipa pelo fantástico momento de enofília proporcionado.
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